A morte do design thinking é contestada por uma acadêmica brasileira
Por Ellen Kiss
Recentemente, Época NEGÓCIOS apresentou neste espaço as ideias de Donald Norman sobre design thinking e etnografia. Célebre intelectual na área de design e autor do legendário livro O Design do Dia a Dia, ele fez a seguinte afirmação: “Cheguei a uma conclusão desconcertante: a pesquisa dos designers e etnólogos é muito boa para melhorar produtos existentes, mas não serve aos grandes avanços de inovação”. Em outras palavras, para ele a inovação é alcançada por um processo em que, num primeiro momento, está a criação de novas tecnologias, em segundo, a invenção de novos produtos, e somente em último lugar, a identificação de necessidade e de uso para aqueles produtos.
A afirmação do autor gerou incômodo e discussões globais sobre o papel do design e todas as suas derivações. As opiniões a respeito da conclusão de Norman são, de certa forma, divergentes, mas, de um modo geral, a comunidade especializada aponta que, desta vez, o autor está errado. O modelo de inovação de Norman consiste em uma visão antiga, de cima para baixo, em que engenheiros inventam novas tecnologias, o marketing desenvolve produtos, os designers acrescentam uma imagem atraente e, então, o produto é lançado, com a esperança de que os usuários adotem a novidade. É um modelo completamente ultrapassado.
Invenção e inovação são produtos totalmente distintos. A invenção deve ter valor socioeconômico para se tornar inovação. As empresas devem concentrar-se em como podem oferecer novas possibilidades que tragam real valor para a vida cotidiana das pessoas. Para empresas como a Nike, por exemplo, o foco de inovação deslocou-se dos tênis para a experiência oferecida ao consumidor em correr e praticar esportes. Para a Apple, a inovação está mais na experiência em escutar música do que no próprio aparelho de MP3.
O caminho para a inovação está na socialização da invenção. Nesse contexto, não estamos somente em busca de inovações radicais baseadas em novas tecnologias, como fala Don Norman. A indústria robótica japonesa é um exemplo de invenção que não se tornou inovação, já que não se encontrou uso para os robôs, com algumas raras exceções. Apesar de ser uma grande invenção, o andador Segway ainda está aguardando para ser socializado.
Com o atual estágio de desenvolvimento, em que se torna possível produzir praticamente tudo, a questão é outra. A pergunta central é o que produzir, de que produto as pessoas precisam. E a resposta só será encontrada a partir de um profundo conhecimento das pessoas.
O surgimento do design thinking e novos métodos derivados de outras áreas de conhecimento, como pesquisas etnográficas, possibilita a construção de um novo método de inovação, plano, dinâmico e colaborativo. Um modelo que envolve as pessoas no processo, em vez de fazê-las aguardar pela invenção. Pesquisas etnográficas também são extremamente importantes na era da cocriação e das mídias sociais, em que consumidores constantemente têm o que dizer sobre os produtos e serviços que usam.
Nesse contexto, design thinking, diferentemente do que afirma Norman, está se tornando uma poderosa ferramenta para as empresas enxergarem novas oportunidades de inovação. Durante a última Conferência de Design Research, realizada em maio em Chicago, Norman afirmou que design thinking é um termo que deveria morrer. Acredito que ele será obrigado a rever seus modelos, considerando que ele mesmo se descreve no Twitter como design thinker.
Ellen Kiss é coordenadora acadêmica da pós-graduação em Design Estratégico, na ESPM
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