quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Água e envelhecimento

Por: Arnaldo Lichtenstein  
Sempre que dou aula de Clínica Médica a estudantes do quarto ano de Medicina, lanço a pergunta:
“Quais as causas que mais fazem o vovô ou a vovó terem confusão mental?”
 
Alguns arriscam: “Tumor na cabeça”.
Eu digo: “Não”.
Outros apostam: “Mal de Alzheimer”.
Respondo, novamente: “Não”.
A cada negativa a turma espanta-se.
 
E ficam ainda mais boquiabertos quando enumero as causas: “Diabetes descontrolado; infecção urinária; desidratação”.
 
A família passou um dia inteiro no shopping, enquanto os idosos ficaram em casa. Parece brincadeira,
mas não é.
 
Constantemente vovô e vovó, sem sentir sede, deixam de tomar líquidos. Quando falta gente em casa para lembrá-los, desidratam-se com rapidez.
 
A desidratação tende a ser grave e afeta todo o organismo. Pode causar confusão mental abrupta, queda de pressão arterial, aumento dos batimentos cardíacos (”batedeira”), angina (dor no peito), coma e até morte.
 
Insisto: Não é brincadeira.
 
Ao nascermos, 90% do nosso corpo é constituído de água.
Na adolescência, isso cai para 70%. Na fase adulta, para 60%.
 
Na terceira idade, que começa aos 60 anos, temos pouco mais de 50% de água. Isso faz parte do processo natural de envelhecimento. Mesmo desidratados, eles não sentem vontade de tomar água, pois os seus mecanismos de equilíbrio interno não funcionam muito bem..  Portanto, de saída, os idosos têm menor reserva hídrica.
 
Mas há outro complicador. Explico:
 
Nós temos sensores de água em várias partes do organismo. São eles que verificam a adequação do nível. Quando ele cai, aciona-se automaticamente um “alarme”.
Pouca água significa menor quantidade de sangue, de oxigênio e de sais minerais em nossas artérias e veias.
 
Por isso, o corpo “pede” água.
A informação é passada ao cérebro, a gente sente sede e sai em busca de líquidos.
Nos idosos, porém, esses mecanismos são menos eficientes.
A detecção de falta de água corporal e a percepção da sede ficam prejudicadas.
Alguns, ainda, devido a certas doenças, como a dolorosa artrose, evitam movimentar-se até para ir tomar água.  
 
Conclusão:
 
Idosos desidratam-se facilmente não apenas porque possuem reserva hídrica menor, mas também porque percebem menos a falta de água em seu corpo. Além disso, para a desidratação ser grave, eles não precisam de grandes perdas, como diarréias, vômitos ou exposição intensa ao sol. Basta o dia estar quente – e o verão  sempre vem aí – ou a umidade do ar baixar muito – como tem sido comum nos últimos meses.
Nessas situações, perde-se mais água pela respiração e pelo suor. Se não houver reposição adequada, é desidratação na certa.
Mesmo que o idoso seja saudável, fica prejudicado o desempenho das reações químicas e funções de todo o seu organismo.
 
Por isso, aqui vão dois alertas.
O primeiro é para vovós e vovôs:
Tornem voluntário o hábito de beber líquidos.
Bebam toda vez que houver uma oportunidade.
Por líquido entenda-se água, sucos, chás, água-de-coco, leite. Sopa, gelatina e frutas ricas em água, como melão, melancia, abacaxi, laranja e tangerina, também funcionam.
O importante é, a cada duas horas, botar algum líquido para dentro.
 
Lembrem-se disso!
 
Meu segundo alerta é para os familiares:
Ofereçam constantemente líquidos aos idosos. Lembrem-lhes de que isso é vital.
Ao mesmo tempo, fiquem atentos.
Ao perceberem que estão rejeitando líquidos e, de um dia para o outro, ficam confusos, irritadiços, fora do ar, atenção.
É quase certo que esses sintomas sejam decorrentes de desidratação.
Líquido neles e rápido para um serviço médico.
 
(*) Texto  de Arnaldo Lichtenstein (46), médico, é clínico-geral do  Hospital das Clínicas e professor colaborador do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

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